Anúncio da Aids 2026 no Rio mobiliza sociedade civil e comunidade científica

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Escolha do Brasil como sede da IAS 2026 gerou forte repercussão entre especialistas e movimentos sociais, que destacam a importância simbólica e estratégica do evento no Sul global.

A confirmação de que o Brasil sediará, pela primeira vez, a Conferência Internacional de Aids provocou forte repercussão entre cientistas, ativistas, gestores públicos e representantes da sociedade civil. O evento, promovido pela International Aids Society (IAS), acontecerá entre 25 e 30 de julho de 2026, no Riocentro, no Rio de Janeiro, em formato híbrido. A expectativa é reunir de 7 mil a 10 mil pessoas de todas as regiões do mundo, consolidando o Brasil no centro do debate global sobre HIV e Aids.

Para a dra. Beatriz Grinsztejn, infectologista brasileira e atual presidente da IAS, sediar a conferência no Brasil é motivo de orgulho e reconhecimento:

“Desde 2024, eu tenho a honra de presidir a IAS, uma organização que reúne mais de 12 mil pesquisadores, profissionais de saúde, gestores e representantes de movimentos sociais de todo o mundo. A IAS promove, a cada dois anos, a Conferência Internacional de Aids, o maior evento global sobre o tema. Com muito orgulho, anunciamos que a 26ª edição da conferência será realizada no Rio de Janeiro, pela primeira vez na nossa região. Esperamos receber entre 7 e 10 mil pessoas em julho de 2026, com uma grande Global Village, como já é tradição. Esperamos uma participação massiva da sociedade civil, que é a alma e a força dessa conferência. A América Latina é uma das poucas regiões do mundo onde ainda se observa aumento nas novas infecções por HIV, especialmente entre as populações mais vulneráveis. O Brasil, no entanto, se destaca na região por sua longa e respeitada trajetória de enfrentamento à epidemia. Temos uma abordagem baseada na ciência e no acesso universal, tanto aos antirretrovirais quanto às estratégias de prevenção, como a PrEP. Somos o único país com mais de 100 milhões de habitantes que conta com um sistema de saúde universal e gratuito. As políticas de tratamento seriam impensáveis sem o SUS. Vivemos hoje um contexto global marcado por retrocessos democráticos, ataques à ciência, emergências climáticas e graves desigualdades sociais. Nesse cenário, a conferência será uma oportunidade importante para o Brasil reafirmar seu protagonismo na resposta ao HIV e dar visibilidade aos grupos historicamente negligenciados. Contamos com a presença e o apoio de todos vocês. Muito obrigado.”

 

A jornalista e consultora internacional Fabiana Mesquita, do Instituto Multiverso, destacou o significado da realização da conferência na América Latina:

“A realização da IAS no Rio de Janeiro no ano que vem é um marco histórico e super simbólico. Depois de décadas acontecendo no hemisfério Norte, a principal conferência mundial sobre HIV e aids vem pra América Latina — e isso significa muita coisa. Significa visibilidade para as nossas lutas, pros nossos territórios, pro ativismo que nunca parou. É uma chance de mostrar a força da ciência brasileira, da sociedade civil organizada e de pressionar por políticas públicas mais justas e eficazes. Estar no Rio facilita o acesso de quem sempre foi deixado de fora desses espaços: juventudes, pessoas pretas, indígenas, populações periféricas e comunidades latinas. É hora de ocupar, trocar, visibilizar e fortalecer a resposta ao HIV a partir do Sul global. O mundo vai olhar pra cá — e a gente tem muito o que mostrar.”

 

Beto de Jesus, diretor da AHF Brasil, reforçou a importância da conferência para a discussão de novas tecnologias e fortalecimento de políticas públicas:

“Já estamos na expectativa para a Conferência Internacional de Aids 2026, que acontecerá pela primeira vez aqui na América do Sul, no Rio de Janeiro. Estamos muito animados em ter, aqui no Brasil, este evento tão importante no debate sobre o futuro da resposta ao HIV baseada em pesquisas e evidências. Nosso país tem o desafio de integrar novas estratégias, como o Lenacapavir, ao sistema público de saúde, e de reforçar as ações de prevenção como um todo. Esta será uma excelente oportunidade para discutir a viabilização do acesso universal aos métodos mais inovadores de prevenção e tratamento. O evento é também mais uma chance para alinhar as ações necessárias para que possamos atingir as metas globais estabelecidas pela ONU para 2030. A participação de tantos especialistas e membros dos movimentos sociais é essencial para definir ações realmente efetivas — e é o primeiro passo para garantir que a evolução na resposta à epidemia siga firme, e que as inovações cheguem a todas as pessoas que precisam, em todo o mundo.”

Para Silvia Aloia, do Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas, a conferência no Brasil é um reconhecimento histórico:

“Foi muito bom receber a notícia de que a conferência da IAS será no Rio de Janeiro em 2026. É um grande avanço pra nós, pra podermos ter oportunidades de mostrar para todos que somos pioneiros na resposta à epidemia da aids. Seria inadmissível não ter essa conferência aqui no Brasil. Temos aí a oportunidade de mostrar isso, e também colocar todos os ideais que tivemos lá no início da epidemia, que fizeram o Brasil ser referência internacional. Já fomos discriminados, com vistos negados mesmo com passagem comprada. Está mais do que na hora de recebermos a IAS aqui. A Global Village é muito rica, e agora que vai ser aqui, vamos poder ter mais gente participando. É um espaço onde pessoas que não têm condições de pagar ou viajar podem estar presentes. Estou muito feliz por isso.”

Adriana Bertini

A artista visual e ativista Adriana Bertini, que participou da primeira Global Village, também comemorou:

“Quando nasceu a Global Village, isso foi um marco de integração entre arte, ativismo, ONGs e comunidades. Foi nesse espaço que comecei a expor as minhas obras. Eu testemunhei de perto o poder da arte como linguagem de transformação. É o papel essencial do nosso modelo de resposta — das ONGs, das comunidades — que representa esse espaço. Tenho muito orgulho do Brasil receber esse evento internacional. O país foi referência, mas também entrou em retrocesso. Precisamos voltar a ter esse papel. A IAS no Rio não é só um marco geográfico, é um reconhecimento de um país que já enfrentou o mundo com uma resposta humanizada, integral e inovadora. Ter a Bia como presidente, a terceira mulher a ocupar esse cargo, representa muito. É hora de reafirmar o futuro da luta.”

O médico Álvaro Furtado, do Centro de Referência e Treinamento em DST/Aids de São Paulo, destacou os desafios e a importância simbólica do evento:

“É um momento crítico para a resposta global da HIV. O Congresso Mundial na cidade do Rio de Janeiro é mais do que um encontro científico. É uma reafirmação da política, da história da HIV no Brasil, e também um momento de discussão de questões sociais. O Brasil desde os anos 90 é uma referência, é uma resposta ousada à epidemia: acesso universal, gratuito, política nacional de produção de medicamentos, quebras de patentes, atuação forte da sociedade civil, uma política baseada em evidências. Mas os tempos mudaram e os desafios também. Nos últimos meses, o mundo acompanhou uma preocupação com as notícias recentes de cortes de financiamento em áreas estratégicas, como o Fundo Global, o PEPFAR, e o encerramento dos estudos promissores de vacina de RNA mensageiro. São sinais alarmantes de retrocesso no investimento internacional na ciência e na inovação. Por isso, sediar um congresso no Brasil tem um peso imenso. É uma oportunidade enorme de reafirmar o compromisso com a ciência, com a vida e os direitos humanos. E um país que ainda carrega uma enorme desigualdade regional, estigma e epidemia concentrada em populações vulnerabilizadas. Mas também é hora de celebrar as conquistas brasileiras: ampliação da PrEP, redução da transmissão vertical, fortalecimento de redes de cuidado, protagonismo de pessoas vivendo com HIV na formação de políticas e redes sociais. O evento deve ser um espaço de escuta e revisão de como garantir o acesso efetivo à prevenção e tratamento, combater o aumento de novas infecções em jovens e pessoas trans, promover os avanços contra o negacionismo e transformar os dados científicos em políticas públicas reais, sustentáveis e inclusivas. Então fazer um evento na cidade do Rio de Janeiro é convocar o mundo para olhar para o Brasil, e o Brasil para olhar para si mesmo, com coragem, com memórias e com um futuro incerto nos próximos meses.”

Fonte: Redação da Agência de Notícias da Aids